Se todos nós amássemos o nosso País como os sulistas, o Brasil seria outro... O Brasil tem milhões de brasileiros que gastam sua energia distribuindo ressentimentos passivos.
Olham o escândalo na televisão e exclamam 'que horror'.
Sabem do roubo do político e falam 'que vergonha'.
Vêem a fila de aposentados ao sol e comentam 'que absurdo'.
Assistem a uma quase pornografia no programa dominical de televisão e dizem 'que baixaria'.
Assustam-se com os ataques dos criminosos e choram 'que medo'. E pronto!
Pois acho que precisamos de uma transição 'neste país'.
Do ressentimento passivo à participação ativa'.
Pois recentemente estive em Porto Alegre, Caxias do Sul, Florianópolis, Joinville, Foz do Iguaçu e Curitiba, onde pude apreciar atitudes com as quais não estou acostumado, ainda mais um paulista/paulistano que sou.
Um regionalismo que simplesmente não existe na São Paulo que, sendo de todos, não é de ninguém. No Paraná, palestrando num evento da FAE, uma surpresa.
Abriram com o Hino Nacional.
Todos em pé, cantando.
Em seguida, o apresentador anunciou o Hino do Estado do Paraná.
Fiquei curioso. Como seria o hino?
Comentei com um senhor ao meu lado, e ele disse que em todas as partidas de futebol no estado, o hino estadual também é executado.
Começa a tocar e, para minha surpresa, quase todos cantam a letra:
“Entre os astros do Cruzeiro!
És o mais belo a fulgir,
Paraná serás luzeiro, Avante para o porvir!
A glória, Santuário..
Que o povo aspire e que idolatre-a...
E brilharás com brilho vário,
Estrela rútila da Pátria,
Pela vitória do mais forte,
Lutar, lutar, chegada é a hora!"
Na semana seguinte, em um belo evento que palestrei na Sindirádio em Porto Alegre, pós Hino Nacional Brasileiro, toca-se o Hino do Estado do Rio Grande do Sul:
“Como a aurora precursora
do farol da divindade,
foi o vinte de setembro
o precursor da liberdade”
Em seguida um casal, sentado do meu lado, prepara um chimarrão. Com garrafa de água quente e tudo. E oferece aos que estão em volta. Durante o evento, a cuia passa de mão em mão, até para mim eles oferecem. E eu fico pasmo. Todos colocando a boca na bomba, mesmo pessoas que não se conhecem. Aquilo cria um espírito de comunidade ao qual eu, paulista, não estou acostumado.
Desde que saí de Bauru, nos anos setenta, não sei mais o que é 'comunidade'.
Fiquei imaginando quem é que sabe cantar o hino de São Paulo.
Aliás, você sabia que São Paulo tem hino? Que o Rio de Janeiro tem hino? Pois é...
Foi então que me deu um estalo.
Sabe como é que os 'ressentimentos passivos' se transformarão em participação ativa?
De onde virá o grito de 'basta' contra os escândalos, a corrupção e o deboche que tomaram conta do Brasil?
De São Paulo é que não será.
Esse grito exige consciência coletiva, algo que há muito não existe em São Paulo e Rio de Janeiro.
Os paulistas e cariocas perderam a capacidade de mobilização. Não têm mais interesse por sair às ruas contra a corrupção.
São Paulo é um grande campo de refugiados, sem personalidade, sem cultura própria, sem 'liga'.
Cada um por si e o todo que se dane.
E isso é até compreensível numa cidade com 12 milhões de habitantes.
Penso que o grito - se vier - só poderá partir das comunidades que ainda têm essa 'liga'. A mesma que eu vi em Curitiba e Porto Alegre.
Algo me diz que mais uma vez os brasileiros apaixonados do sul é que levantarão a bandeira. Que buscarão em suas raízes a indignação que não se encontra mais em São Paulo, Rio, etc.
Que venham, pois. Com orgulho me juntarei a eles.
De minha parte, eu acrescentaria, ainda:
'...Sirvam nossas façanhas, de modelo a toda terra...'
Arnaldo Jabor